Racismo é origem do atual formato das cidades brasileiras, dizem especialistas
O racismo como divisor das cidades foi o tema de audiência pública realizada pela Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados (5/7).
Para estudiosos, o racismo foi o grande responsável pela divisão das cidades brasileiras da maneira como elas estão hoje: pobres e negros morando nas periferias e brancos ricos morando nos melhores bairros.
A arquiteta Joice Berth lembrou que o problema começou justamente após a abolição da escravatura, no século XIX, quando foi editado o código de postura, com regras que proibiam a posse de terra por negros, e uma legislação que facilitava a aquisição de terras por imigrantes europeus.
"O estruturador social é o racismo. Então a gente tem que trabalhar a partir dele para pensar nessas desigualdades sociais que também se aplicam e vão sendo espelhadas, produzidas e reproduzidas no espaço das nossas cidades. Não tem como a gente falar em direito à cidade sem considerar isso. Não tem como a gente falar em cidades sustentáveis sem considerar as desigualdades e a formação delas, a raiz das desigualdades, que são o racismo e o machismo."
A promotora de Justiça da Bahia Lívia Santana afirmou que, por falta de estrutura, a população negra nas periferias está mais vulnerável à violência e, por isso, o Estado precisa investir em equipamentos que garantam segurança, educação e lazer.
"Há necessidade realmente de se fazer uma participação ativa do Estado, mas também do cidadão. É importante que o cidadão consiga participar ativamente das decisões sobre a cidade porque essas decisões afetam as pessoas. Então o direito à cidade ainda é, no nosso país, por conta do racismo institucional, ele persiste sendo um direito racialmente condicionado."
O deputado João Daniel, do PT de Sergipe, lembrou que existe uma dívida histórica no Brasil em relação aos negros e, por isso, políticas públicas de igualdade não devem sair da pauta de discussão da Câmara.
"O Brasil é um dos poucos países que fez legalmente a abolição, a libertação dos escravos, mas não fez a distribuição da terra, que é o grande problema desse país, não fez a reforma agrária, não fez a reforma urbana."
Um caso que mobilizou os movimentos sociais foi o de Dona Vilma Eustáquia da Silva, de 73 anos. No início deste ano, a Justiça, após pedido da prefeitura de Belo Horizonte, autorizou o despejo de Dona Vilma e a demolição da casa onde ela vivia desde que nasceu. O município alega que o imóvel, comprado pelo pai de Dona Vilma quando trabalhou na construção de Belo Horizonte nos anos de 1920, é público.
A filha de Dona Vilma, Heloiza Helena, esteve na audiência na Câmara e informou que o despejo foi suspenso pela prefeitura, mas em caráter provisório, enquanto a mãe for viva. Ela informou que o IPTU do terreno onde está a casa da mãe está sendo pago desde 1930, o que indicaria o direito de propriedade de Dona Vilma.

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